quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Cecília no País das Maravilhas

Cecília olhava distraída para as águas do rio. Entrou e saiu diversas vezes da água, até cansar. Era uma tarde amena, com sol fraco e brisa suave. Um dia bom para tomar banho de rio. A menina andara até ali sozinha, como já fizera outras vezes, para
refrescar-se. A cidade era quente, a maior parte do tempo. A praia, tão longe que Cecília não tomava conhecimento de sua existência. Mas o rio estava sempre ali, pronto, esperando por ela. E como ela gostava daquele rio! Tão distraída estava que não percebeu o perigo que a rondava.
Por toda a volta do rio, animais de todo porte circulavam. Cecília os reconhecia e amava. Alguns, no entanto, eram traiçoeiros. E foi um destes que se aproximou da menina. Uma cobra enorme rastejou discretamente até seu lado. Quando preparava-se para dar o bote, Cecília sentiu sua presença. Apavorada, saiu correndo para dentro da mata.
Cecília correu e correu até perder o fôlego. Parou, cansada, para respirar com calma. Olhou para trás: nem sinal da cobra.
Olhou à sua volta: só verde por todo lado. Tinha entrado bem dentro da mata e sabia estar perdida. 'Pelo menos estou segura', pensou. 'Mas, como vou sair daqui?'
A menina pensou em voltar no sentido de onde viera, mas o medo da cobra a impedia. Estava refletindo sobre o que fazer quando algo passou rápido ao lado dos seus pés. Cecília só viu uma pequena mancha branca pulando e, curiosa, resolveu ver o que era.
Logo adiante, o animal parou. Era um coelho, a menina viu. O pequeno coelho entrou
dentro de uma gruta e Cecília resolveu segui-lo. Mas logo se arrependeu de fazê-lo.
Cecília não poderia saber, mas a gruta não tinha chão: assim que entrou, a menina caiu num imenso buraco escuro, que parecia não ter fim. Caiu, caiu, caiu. Até que... poft! Bateu com o bumbum no chão. 'Finalmente!' - pensou – 'estou pisando em algo'. Cecília levantou e saiu andando. Notou que estava dentro de um túnel estreito. Caminhou pouco e logo chegou ao final do túnel. E o que viu foi inacreditável!
Diante de seus olhos, a mais perfeita floresta que já vira na vida! As árvores verdes,verdes, verdes, com frutas de todo tipo. O chão, coberto de uma grama macia, fininha. Flores de todas as cores enfeitavam a paisagem. Ao longe, uma cachoeira de águas bem claras terminada em um rio sinuoso. E, o mais inacreditável: um céu azul azul azul, com dois sóis brilhando forte no meio dele! Cecília coçou o olho uma, duas, vinte vezes! Não acreditava que aquilo fosse possível, mas estava mesmo vendo aquilo! Um outro mundo, debaixo da terra. Muito mais colorido e perfumado que o seu. Cecília estava encantada!
Caminhou sem pressa pela grama, parou para cheirar muitas flores. Sacudiu o galho de uma árvore e comeu a maçã mais doce de toda sua vida. Andou até o rio e tomou um banho refrescante na cachoeira gelada. Por todo canto, pássaros entoavam doces melodias. Cecília estava feliz. Nadou pelo rio calmo
até alcançar a margem. Saiu, devagar, e sentou-se à beira dele. De repente, sentiu um vulto. 'Uma cobra!', pensou, lembrando-se do perigo que correra mais cedo.
Levantou-se rápido e virou-se, preparada para enfrentar um bicho. Mas, desta vez, não tinha bicho. Atrás de Cecília, sorrindo para ela, estava uma menina. Uma linda menina de cabelos amarelos e olhos azuis.
  • Olá! Desculpe, não quis assustá-la.
  • Mas assustou! Achei que fosse uma cobra!
  • Cobra? - a menina riu – não temos cobras por aqui!
  • Não tem cobras? Nunca vi uma floresta que não tivesse cobras!
  • Aqui não tem. Como você se chama?
  • Cecília. E você?
  • Alice.
  • E você mora aqui?
  • Agora, moro.
  • E que lugar é este?
  • É a minha casa, oras!
  • Sua casa? Esta floresta?
  • Tudo isto. A floresta, a cachoeira, o rio. E minha casa, que fica logo ali adiante. - disse Alice, apontando uma casinha que Cecíli
    a não tinha visto até então.
  • Nossa! Muito linda a sua casa! - Cecília estava encantada com aquele lugar.
  • Obrigada. E você? Mora perto?
  • Moro lá em cima, no alto do buraco.
  • E lá tem floresta?
  • Tem, sim. Tem um rio enorme, muito maior do que este aqui. E tem cobra...
  • Ruim ter cobra, não é?
  • Não muito. Só se elas resolverem pegar o pé da gente.
  • É, acho que sim. Você gosta de morar lá?
  • Gosto, sim. Moro com a minha mãe. Estamos sempre bem juntinhas.
  • Eu moro com a Diná, minha gatinha
  • Só vocês duas?
  • É, somos só nós duas. Como você.
  • É, como eu... - Cecília pensou um minuto. - Mas eu tenho a minha avó, também.
  • É bom ter avó?
  • É como ter uma mãe que não dá bronca.
  • Ah, então é muito bom!
  • É, sim! E ter uma gatinha, é bom?
  • É, muito! A Diná é muito carinhosa. Mesmo se eu dou bronca nela!
  • E você dá bronca nela?
  • Às vezes eu tenho que dar. Você sabe, é como se eu fosse a mamãezinha dela.
  • Tem que cuidar dela, né?
  • É, tenho.
As duas meninas ficaram, então em silêncio, paradas, olhando para o rio. Cecília pensava em sua mãe, agora. Estaria ela preocupada com seu sumiço? Há quanto tempo estava ali embaixo? Tinha perdido a noção das horas e achava que sua mãe deveria estar angustiada com sua demora.
  • Eu acho melhor eu voltar para casa, agora.
  • Por que?
  • Porque minha mãe deve estar preocupada.
  • Por que você não a traz aqui?
  • Seria bom, né?
  • Claro! Acho que ela ia gostar muito! E eu ia gostar de ter vocês aqui, também.
Cecília ficou pensando. Olhou tudo à sua volta, com atenção aos mínimos detalhes. Tudo ali parecia melhor do que seu mundo. As cores pareciam mais vivas, as flores mais cheirosas, o ar mais puro e os animais mais felizes. Se sua mãe estivesse ali, seria mesmo perfeito. Ficou pensando nisto durante muito tempo. Por fim, disse:
  • Este mundo é perfeito, Alice!
  • Claro que é, Cecília! É o país das maravilhas, o meu país! Mudei-me para cá e trouxe parte dele comigo. A melhor parte.
  • Entendo... Mas, veja, não é o meu mundo.
  • Mas é melhor do que o seu mundo, Cecília!
  • Pode ser. Meu mundo não é perfeito, mesmo. Tem muita coisa errada acontecendo nele. Tem gente acabando com a floresta tem gente que maltrata os animais...
  • Então! Por que você não muda para cá, de uma vez?
Cecília sorriu. E disse:
  • Porque aqui é perfeito. O meu mundo, não é. Mas, quem sabe, se não sou eu quem vou conseguir mudar o mundo lá em cima?
  • Você vai?
  • E por que não? Uma hora, alguém precisa começar a consertar o que está errado!
  • Mas aqui você também pode mudar as coisas!
  • Eu sei, eu sei! - riu Cecília – mas é lá que precisam de ajuda.
  • Volte, então, para me visitar. Ao menos prometa-me isso.
  • Está prometido! Agora, me diga como faço para sair daqui.
  • É só pegar o caminho de volta – disse Alice, apontando o túnel de onde Cecília caíra.- Vá andando e andando e quando você piscar os olhos estará de volta ao lugar de onde veio.
  • Ah, sim. Está certo. Bom, até a próxima! - disse Cecília, dando um abraço em Alice.
  • Apareça sempre! - respondeu Alice, abraçando Cecília com força.
Cecília começou a caminhar de volta e em instantes estava dentro do túnel. Ele parecia ainda mais escuro que antes e a menina não enxergava nada. Estava andando devagar, preocupada em não cair naquele imenso breu e não achar mais a saída para lugar nenhum. Andou, andou, até que...
  • Cecília! Cecília!
  • Ãhn?
  • Cecília, o que houve?
  • O que... Onde estou?
  • Na beira do Araguaia – respondeu sua mãe rindo. Dormindo! O que aconteceu, Cecis?
A menina olhou à sua volta. Teria sido tudo aquilo um sonho?Não, tinha sido real. Ela sabia.
  • Mamãe... quanto tempo eu dormi?
  • Não sei filha, vim te buscar agora. Vamos para casa?
  • Claro.
  • Que cara é esta, Cecis, aconteceu alguma coisa?
  • Eu estive viajando pelo país das maravilhas...
  • Ah, sim – concordou sua mãe, sorrindo. E que tal o país das maravilhas?
  • Muito diferente do nosso!
  • É mesmo? E qual você prefere?
  • O nosso, certamente.
  • Mesmo sem ser das maravilhas?
  • Tem muita maravilha aqui, mãe. Basta o povo ter consciência disto. E exigir mudanças no rumo da nossa história!
  • Nossa! Tá falando como política!
  • Quem sabe? - disse Cecília rindo – o que tem para o jantar?
  • Tudo que você quiser!
Mãe e filha, unidas como sempre, voltaram juntas para casa. Teh, a mãe de Cecília, passou a brincar com a filha, dizendo que ela era o futuro do país. Teh não sabia, mas estava certa. Toda criança é mesmo o futuro do seu país. E quem sabe não é da força do Rio Araguia que o país precisa para mudar? Pode estar tudo nas mãos de uma pequena menina, nascida às suas margens e criada com tanto amor e dedicação pela mãe, o futuro deste país de maravilhas...

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