quarta-feira, 5 de setembro de 2012

O tigre e medo de tigre


Os dois eram animais, é fato. Além disto, mais nada tinham em comum. Nem mesmo o fato de serem animais poderia ser considerado como um traço conjunto: um era um enorme mamífero, enquanto o outro, um minúsculo inseto.
Cada um tinha a sua existência própria, sem nem saber da do outro. O tigre, forte e ligeiro, era conhecido por toda a selva. Era um bom tigre, aquele. Não por ser tigre, porque isto não dá a ninguém a condição de ser bom. Era um um bom tigre porque era generoso. Ajudava aos animais que precisavam de ajuda, procurava ser solidário. Tinha muitos amigos, como era de se esperar. Mas tinha também um segredo.
Todos os dias, durante o dia, o tigre estava em todos os lugares. Se uma garça enfiasse os pés na areia movediça, lá ia o bondoso tigre socorrer. E era assim o dia todo: ajudava aos demais, sem esperar nada em troca. Durante a noite, no entanto, o grande tigre evaporava. Ninguém sabia onde ele estava, se dormia ou não. Só sabiam que, à noite, ele sumia.
Nenhum dos animais prestava muita atenção ao sumiço do tigre. Um animal tão grande e tão forte poderia enfrentar qualquer perigo, todos sabiam. Por isso, julgavam que ele deveria ter um sono muito pesado. Diziam: 'quando dorme, o tigre vira um urso: hiberna e ninguém consegue acordá-lo!' O tigre, por sua vez, nunca desmentiu esta história. Achava graça em ser comparado ao urso e não queria que soubessem a verdade.
O que o tigre não contava a ninguém, o que ele mantinha em segredo, era que tinha um medo. Um medo tão, mas tão grande, que o deixava pequeno. Ele não conseguia enfrentar seu medo. E por isso se escondia, todas as noites, para fugir de seu medo. O medo do tigre era maior do que ele, e por isso o dominava. O tigre tinha medo do escuro!
Todas as noite, conforme o sol começava a cair, o tigre corria para dentro de uma caverna. Quietinho, para não chamar a atenção de ninguém, o tigre acendia uma vela. Uma chama forte e quente, que o ajudava a manter a escuridão do lado de fora. E que o deixava dormir tranquilo.
Uma noite, no entanto, o tigre não pode dormir. Era uma noite de outono, mas que anunciava o frio do inverno por vir. Não chovia, é fato. Mas a lua se escondia no céu. E ventava, como ventava!
O tigre fez de tudo para manter acesa a chama da sua vela, mas não conseguiu: o vento era mais forte do que a chama. O vento era mais forte do que o tigre. E até mais forte do o medo do tigre. Quando se viu, sem sua vela acesa, dentro da caverna, o tigre percebeu quão escuro o lugar era. Em pânico, correu para longe da caverna, mergulhando na escuridão da selva. Olhava para todos os lados, em desespero. Nenhum sinal de luz. Ali, no meio do nada, sentia o medo invadir todo o seu enorme corpo. Sentia-se fraco, tomado por aquele medo que era maior do que ele.
E foi então que o impossível aconteceu. O tigre viu um ponto de luz. Ao longe, fraco, um pontinho de luz que ia e vinha. No meio de toda aquela noite negra, onde nada se enxergava, ele viu a luz.
No auge de sua agonia, só pensava em se livrar do escuro. Foi mais forte do que o medo, e conseguiu correr até a luz. Chegando ao pontinho, levou um susto. Um minúsculo inseto piscava sem parar, voando de um lado para outro. O tigre viu, ali, sua chance de se livrar do escuro. Aproximou-se e, gentilmente, pediu:
    • Olá. Será que você poderia parar de piscar um pouquinho?
    • Oh, desculpe! Não sabia que minha luz o atrapalhava! Vou parar agora de...
    • Não! - gritou o tigre – você não me entendeu. O que me atrapalha não é a sua luz, é a falta dela. Você pode ficar brilhando o tempo todo, por favor?
    • Sim, claro. Mas eu me canso demais.
    • Não podemos sentar e conversar um pouco? Daí você descansa e ilumina também.
    • Claro, claro. Boa ideia.
O tigre e o vaga-lume começaram a conversar. O tigre acabou confessando o seu medo ao vaga-lume, que se assustou. 'Como alguém tão grande pode ter medo de algo tão insignificante quanto o escuro?' Mas também o vaga-lume tinha seus medos, e os confidenciou ao tigre. Passaram a noite em claro, conversando. Só perceberam que não tinham dormido quando viram o sol raiando.
Deste dia em diante, o tigre não teve mais medo. Por menor que fosse o vaga-lume, ele trouxe luz à sua vida. Era um inseto tão pequeno, mas era maior do que o medo do tigre. Com o tempo, o tigre acabou perdendo o medo do escuro. Saber que tinha um amigo por perto para iluminar o seu caminho era o suficiente. Por isso é tão bom termos vaga-lumes em nossas vidas. Podem ser pequenos e ter uma luz fraquinha, mas é suficiente para nos livrar da escuridão e afastar os nossos medos...

Os músicos de Bremem



Era uma vez um cão que sabia caçar coelhos como ninguém. Seu dono era
muito exigente.
Quando o cão ficou velho, seu dono achou que ele não serviria mais para
nada.
Levou o cão para uma floresta e o abandonou lá. O pobrezinho ficou
apavorado. Aí, apareceu um burro muito triste, que contou que apanhava
muito de seu dono e por isso tinha fugido de casa.
Tornaram-se amigos e logo começaram a falar de música. O cão tocava
tambor e o burro, flauta. Resolveram ir para cidade deBremen, onde
havia uma orquestra municipal.
Adiante, encontraram um gato chorando. o gato contou que a sua dona o
tratava muito mal e por isso tinha fugido de casa.
O cão e o burro convidaram o gato para ir com eles paraBremen.
Muito feliz, o gato que sabia tocar trombeta, juntou-se ao grupo.
De repente, encontraram um galo. Ele contou que estava escalado para ir
para a panela. Como tinha uma voz boa, todos concordaram que ele poderia ser
o vocalista.
Ao cair da noite, aproximaram-se de uma casinha que tinham visto ao
longe no meio da floresta.
Chegando mais perto, ouviram umas vozes vindas de dentro da casa.
gato foi escutar através de uma abertura na janela. Voltou e disse:
– Puxa! Quatro ladrões se escondem nesta casa. Então, eles armaram
um plano para expulsar os ladrões dacasa.
Um saltou nas costas do outro: o cão subiu no burro, o gato ficou nas
costas do cachorro e o galo, em cima do gato.
Assim, eles pareciam uma figura monstruosa, que dava medo. Então, foram
em direção a casa, gritando, todos ao mesmo tempo.
Os ladrões levaram um tremendo susto. Achando que o monstro atacara a
casa e saíram correndo. Então, tomaram posse da casa e dormiram
tranqüilos a noite toda.
Na manhã seguinte, fizeram um bom café, pois conseguiram encontrar tudo
nas vizinhanças. E resolveram passar o dia ali. No outro também. Então
eles conversaram e decidiram formar uma orquestra ali mesmo, na
floresta, longe de Bremen. E viveram muito felizes assim.

Um tesouro


Quando eu era pequena, vivia numa cidade pequena, todas as minhas coisas eram pequenas e tudo à minha volta era pequeno. E o meu mundo era enorme, enorme, enorme. Era tão grande que não cabia na minha cidade, nem na cidade vizinha, nem na que vinha depois. Era do tamanho da imaginação de uma criança e por isso ele ia e voltava à lua várias vezes e ainda lhe faltava espaço.
Nem todo mundo via o mundo como eu. Outras crianças, em sua maioria, o tinham da mesma medida. Mas os adultos não entendiam isto. Os adultos o enxergavam nos limites da cidade pequena. E, muitas vezes, o viam ainda menor. Olhavam para frente, sempre para frente, pensando sempre à frente. Esqueciam de virar os olhos e observar as graças do meio do caminho. Não sabiam que deveriam olhar para cima e avistar a lua. Não entendiam que um sonho não tem tamanho. E continuavam vivendo no seu mundo-mundinho.



Os adultos por lá eram assim, menos um. Uma, aliás. Dona Esmeralda. Que não tinha tido filhos e por isso não tinha netos. Mas nos acolhia a todos como se fossemos seus. Seus netos, seus filhos, seus amigos. Seus pupilos, capazes de ver o mundo do tamanho que ele tem. O tamanho do sonho da gente.
Dona Esmeralda brincava com a gente como se fosse, ela mesma, uma criança. Soltava pipa, jogava pião e bolinha de gude, pulava corda e elástico. Ria alto, falava muito, nos ensinava francês. Fazia doces e nos gostava de ver comendo. Depois nos mandava escovar os dentes, porque não queria ninguém sujinho ali. Gostava de nos ver correndo no quintal, para lá e para cá, caindo e ralando o joelho. 'Levanta e sacode a poeira que a dor passa', dizia. E dava um beijo na testa do machucado, para garantir que a dor fosse mesmo embora. E ia, sempre ia.
Um dia, ela não quis brincar. Estava cansada, disse, precisava ficar deitada. No outro, a mesma coisa. No terceiro dia, ainda de cama, nos chamou para ouvir uma história. E contou-nos muitas histórias, em muitos dias seguintes. Histórias de conquistadores, de aventureiros, de desbravadores. Histórias de quem, dizia ela, enxergava o mundo olhando para cima, e não para frente. Histórias de verdade, e outras nem tanto. 'De sonhadores', dizia ela, 'como eu gosto de chamá-los. Ou de loucos, como são pelos outros conhecidos.'
O tempo passou e Dona Esmeralda não conseguia mais brincar, de vez. Sua voz, rouca, foi ficando ofegante, e ela tinha dificuldade de nos contar histórias. E então, surgiu um moço e a levou dali. Foi se tratar, disseram. Viveu ainda muitos e muitos anos, sob cuidados médicos, em uma clínica especializada. Mas não nos deixavam visitá-la, porque criança não podia entrar na clínica.
Passado tanto tempo, olho para trás e vejo tudo o que ela nos ensinou. A olhar para os lados, e observar flores e borboletas que tem no meio do caminho. A parar diante das pedras que surgem, no mesmo caminho, e a encará-las de frente, sem medo. Nos ensinou a pular estas pedras quando, numa brincadeira infantil, nos ensinou a pular a corda. Nos ensinou a enfrentar nossos medos, a vencer monstros, dragões, vampiros. A vencer tudo.






De tudo o que Dona Esmeralda nos ensinou, ficou um pouco. Mas o mais importante, sem dúvida, foi o 'olhar para cima'. Com ela, fomos e voltamos da lua muitas vezes. Aprendemos que o mundo é grande, enorme, gigantesco. Do tamanho do sonho da gente...
De tudo o que Dona Esmeralda nos ensinou, o que mais aprendi foi a sonhar. Dê asas a uma criança que ela voa o mundo todo, indo e vindo sem parar. Porque o mundo pequeno é para a gente grande. Gente pequena tem o mundo grande, grande, grande. Porque olha para cima, voa e sabe sonhar.

A história de uma nuvenzinha que queria virar chuva


Era uma vez uma nuvenzinha branquinha, branquinha, que vivia no meio de um céu muito azul. Ela passava, como todas as outras nuvens, o dia inteiro cirandando no céu azul: ora movia-se na direção do sol, ora era levada pelo vento para perto da lua. Gostava desta vida, mas tinha um grande desejo: ela queria virar chuva!
O desejo da nuvenzinha não era segredo. Pelo contrário: ela fazia questão
de dizer a todos! As nuvens mais velhas a alertavam:
- Nuvenzinha, cuidado! Para virar chuva, você tem que se desmanchar!
Ela ria e brincava com as outras:
- Desmancho tocando a grama e beijando as flores. Tem jeito melhor de desmanchar?
- Mas é perigoso... - continuavam as outras nuvens.
- Perigoso é passar a vida inteira no mesmo lugar, fazendo a mesma coisa, pensando as mesmas ideias! - insistia a nuvenzinha, encerrando o assunto.
Só que o lugar onde a nuvenzinha vivia era sempre de clima ameno. O céu, do azul mais bonito que há, nunca ameaçava uma única gotinha de chuva. E ela, frustrada, ficava esperando quando seria sua vez de condensar.
Um dia, quase sem querer, ela se perdeu na ciranda do céu e foi parar um pouquinho além da lua. Tão pouquinho que ninguém notou que ela tinha se movido. Mas, ela sabia o que tinha acontecido.
No outro dia, a nuvenzinha fez a mesma coisa: chegou um pouco mais para a esquerda da lua. E assim foi, de tantinho em tantinho, se distanciando do céu azul.
Um belo dia, quando o sol despertou, a nuvenzinha olhou em volta e levou um susto: não sabia mais onde estava. Tinha ido para longe do seu céu azul. Estava no meio de um céu diferente, azul acinzentado. Sentiu-se feliz como nunca. 'Cinza é a cor da chuva', pensou 'e eu estou chegando lá!'
Tal como sonhara, o céu azul acinzentado, com o passar dos dias, foi ficando cada vez menos azul e cada vez mais cinza. Até que um dia, não teve jeito: iria chover!
Todas as nuvens do céu cinza estavam se preparando para virar chuva. Mas nenhuma estava tão emocionada quanto a nuvenzinha do céu azul: finalmente realizaria o sonho de sua vida!
Primeiro veio um clarão no céu, seguido de um estrondo. E então, de repente, aconteceu. Todas as nuvens transformaram-se em uma enorme corrente de água, caindo com força do céu.
A nuvenzinha descia lentamente, querendo aproveitar o passeio. Tocou nas árvores, molhou os pássaros, lavou os carros, beijou crianças e flores e então alcançou a grama. Deitou-se, desmanchada e feliz, cercada de verde à sua volta.
No dia seguinte, o sol brilhou forte no céu. Tão, tão forte, que chegou a incomodar a nuvenzinha.
  • O que é isso? O que está acontecendo? - perguntou a nuvenzinha para as gotas de chuva que estavam ao seu lado.
  • Você não sabe?
  • O que?
  • É o sol! Ele agora, começa a nos aquecer.
  • Eu estou quase me desmanchando outra vez! Está quente demais!
  • Pois é isto mesmo: agora, você se desmancha toda de novo. Evapora, sobe aos céus. E vira nuvenzinha outra vez!
A nuvenzinha nunca imaginou o que aconteceria depois que virasse chuva, e agora ela sabia. Voltaria a ser nuvem, voltaria ao céu azul. Sorriu, muito feliz.
  • Por que você ficou tão feliz? - perguntou a gota de chuva – É por que vai voltar para o céu azul?
  • É porque eu vou voltar a ser nuvem, vou voltar a ser chuva, vou me recriar e me desmanchar muitas vezes. E vou aproveitar cada um destes infinitos momentos da minha vida...
E a nuvenzinha fez o que disse: passou a vida inteira se reinventando, sabendo que a vida, como as nuvens, é passageira, e por isso é preciso aproveitar cada minutinho que nos é dado, da melhor forma possível.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Hamster

Hamster: This lively pet hamster will keep you company throughout the day. Watch him run on his wheel, drink water, and eat the food you feed him by clicking your mouse. Click the center of the wheel to make him get back on it.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

O Cavalinho do Carrossel


Era um cavalo lindo, aquele. Era esbelto, de uma cor que reluzia ao sol. Mas não era um cavalo como os outros. Não cavalgava, não trotava, nem mesmo andava. Subia e descia, o dia inteirinho, naquele círculo mágico que fazia a alegria das crianças. Era um cavalo de carrossel.
Chamava-se Léo, o cavalo do carrossel. Tinha nascido ali, naquela roda itinerante, preso num constante vai e vem de pessoas e cidades. Conhecia a todos , já que o dono do carrossel às vezes o mudava de lugar. Seu cantinho preferido era bem no centro do brinquedo, entre dois outros cavalos – seus amigos, Junia e Tando. Como passara a vida toda ali, tudo o que conhecia dos lugares por onde passava era o que podia avistar ali do alto. Só que Léo prestava atenção ao que as crianças que montavam nele falavam. Muitas conversavam com ele, outras conversavam entre si, mas todas tinham algo de interessante a dizer. Léo também ouvia o que os adultos diziam, claro – embora nunca fosse nada tão divertido que valesse a pena prestar atenção. E, de tanto ouvir coisas boas sobre os lugares que haviam além do carrossel, Léo começou a querer sair dali. Nasceu nele uma vontade enorme, incontrolável, de sair do carrossel e cavalgar mundo afora.
Quando Léo disse a todos que queria cavalgar mundo afora, todos o apoiaram. Até mesmo o dono do carrossel, que lhe disse: 'vai Léo, cavalga o que tiver que cavalgar. Ponha asas, ganhe o mundo. Quando sentir saudades, será hora de voltar. Não coloco ninguém em seu lugar, que estará sempre te esperando.' E foi assim que, numa tarde fria de outono, Léo deu um pulo para fora do carrossel e ganhou o mundo.
Léo andou durante algum tempo, sem ver nada que não fosse estrada, antes de avistar algo. Era alguém que se movia devagar e engraçado, como se estivesse rebolando. Léo aproximou-se e viu, em sua frente, outro cavalo que não ele. Este, não era um cavalo de carrossel. Era um pangaré.
  • Olá. Sou Léo, e estou querendo viajar para conhecer tudo o que há por aí.
  • Olá. Você veio de onde?
  • De um carrossel que vai de cidade em cidade acompanhando o circo.
  • Ora, mas então já viajaste muito!
  • Sim e não. Já viajei, mas sempre preso ao carrossel. Agora que ver as coisas além daquela roda, quero cavalgar com minhas próprias patas!
  • Pois então conheceste o pangaré certo para ajudá-lo! Também eu adoro sair trotando por aí e posso acompanhá-lo. Vamos, juntos, então.
  • E como é mesmo o seu nome?
  • Oh, desculpe, não me apresentei! Sou Zé, o pangaré.
  • Que bom, vamos juntos, então. Léo, do carrossel, e Zé, o pangaré!
  • Isso aí, parceiro!
Nos dias seguintes, Léo e Zé tornaram-se inseparáveis. Zé era uma ótima companhia, tinha papo para tudo e para todos, e ensinou a Léo a jogar bola, a correr pelos campos e até mesmo a paquerar! Só que, conforme os dias se passavam, Léo começou a perceber que Zé não queria nada de nada com trabalho. Era um boa-praça, e também um boa-vida. Dizia que as coisas aconteciam naturalmente, que uma hora tudo acabava dando certo e assim levava a vida – uma hora fazendo um bico aqui, outra hora contando com a ajudinha de um amigo ali. Muitos lhe faziam favores, ele era mestre nisso: carismático, envolvia a todos em sua conversa e acabava conseguindo o que queria. Mas Léo não era assim. Não queria depender dos outros, não queria viver de favores. Então, depois de algum tempo, agradeceu ao amigo pela companhia e pelas lições e comunicou ' está na hora de eu continuar conhecendo o mundo'. Despediram-se, e Léo continuou sua jornada.
Depois de andar mais alguns dias, Léo deparou-se com um enorme estábulo. Nunca vira nada assim antes e, encantado, aproximou-se. Viu uma grande pista com obstáculos, onde um belo cavalo saltava, obedecendo aos comandos de uma menininha. Ficou bastante impressionado com aquilo e acabou assistindo ao treino inteiro. Quando a menininha saiu do cavalo, ele foi para o estábulo, onde Léo já estava esperando por ele.
  • Olá! Você salta muito bem, parabéns!
  • Obrigado, amigo. Você também salta?
  • Não, sou um cavalo de carrossel. Só subo e desço, agora que estou conhecendo o mundo. Aprendi a cavalgar ainda outro dia, saltar não tenho como!
  • Imagina. Se você já está acostumado com o sobe e desce do carrossel, vai ser fácil! Querendo aprender, posso te ensinar.
  • Quero, sim, claro! Parece tão divertido!
  • E é mesmo. Eu sou Tião, o garanhão. E você?
  • Sou Léo, do carrossel.
  • Prazer, Léo. Vamos começar os treinos agora mesmo!
Tião, o garanhão, era um cavalo de competição obcecado por medalhas. Sua rotina diária incluía, além dos treinos, exercícios e uma dieta rigorosíssima. Era um cavalo extremamente gentil, mas com gana de vitória. Não poupava esforços para sair-se bem nas competições.
Léo, por outro lado, nunca tivera uma rotina tão rígida quanto aquela. Seu trabalho no carrossel, além de divertido, permitia que ele conhecesse diferentespessoas. Para um cavalo de carrossel, a vida de competidor era árdua demais. Gostou de ter aprendido a saltar e de se exercitar. Gostou até mesmo da dieta restritiva de Tião. Mas, com o passar dos dias, começou a sentir falta da flexibilidade, do poder ir e vir, do descompromisso. Achou que estava na hora de seguir seu caminho. Conversou com Tião, agradeceu-lhe muito por todos os ensinamentos e despediu-se.
O cavalinho de carrossel ainda teria muita coisa por conhecer. Divertiu-se com um cavalinho branco enfeitado que fugira de uma loja de brinquedos, aprendeu a comer milho com um cavalo de fazenda e a entregar o leite com o cavalo que puxava uma carroça. De cada um que conhecia, Léo tirava uma lição. Fazia amigos por todos os lugares onde passava. Mas, teve um dia, que não teve mais vontade de fazer nada.
Neste dia, Léo sentira uma pontada no peito de manhã cedinho. Estranhou, mas não deu muita importância. No decorrer do dia, no entanto, a pontada foi ficando cada vez mais forte, até tomá-lo por completo. Léo entendeu o que acontecia, então. Aquela pontadinha que o tomou por inteiro era saudade. De seus amigos, de seu dono, de sua vida. Do carrossel.
Depois de ter viajado mundo afora, Léo voltou ao carrossel. Contou a todos as novidade, falou do que aprendera. Era, mais do que nunca, um cavalo feliz. Isto ninguém lhe ensinara, ele aprendera por conta própria, e era no pensava sempre. Não importa para onde vamos, nem por quanto tempo iremos ficar. Em algum lugar temos um vínculo do qual não conseguimos nos separar. Viajar o mundo é muito bom, fazer novos amigos é incrível. Mas, o melhor de tudo, é voltar para casa!
Léo agora estava plenamente satisfeito, pois sabia seu lugar no mundo. Continuou viajando muito, sempre que podia. Mas era só a saudade apertar que ele batia em retirada! Ali, naquele carrossel, ele era amado. Ali, naquele carrossel, tinha uma família. E é por isso que em nenhum outro lugar do mundo ele era tão feliz quanto ali...

A Ovelha cor de rosa


Era uma vez, há não muito tempo atrás, uma ovelha muito vaidosa. Ela tinha o pêlo branquinho, branquinho, sem nenhuma mancha, e orgulhava-se de produzir a lã mais macia da região. Um belo dia, esta ovelha vaidosa soube que seria mãe. Recebeu a notícia com alguma preocupação: 'será que vou ficar muito gorda? Será que meu pêlo vai ficar manchado?' Mas, no final das contas, ficou curiosa para saber como seria seu bebêzinho.
No final da primavera a ovelha vaidosa deu à luz uma linda ovelhinha. Mas a ovelhinha, ao contrário da mãe, não tinha o pêlo branquinho, branquinho. Ela era diferente. Da mãe e de todas as outras ovelhas. Ela era uma ovelha cor de rosa.
A mãe, vaidosa como só ela, ao ver a filha tão rosinha, não quis tê-la por perto. 'Uma filha assim, cor de rosa, o que os outros vão pensar de mim?', pensou ela. E deixou a ovelhinha, assim que ela nasceu, num grande pasto que havia ali perto.
A pobre ovelhinha cor de rosa, pequena e com frio, baixinho chorava – mééééé mééééé. As vaquinhas, vendo aquele pequeno novelo de lã rosa ali, compadeceram-se de sua situação. E começaram a tomar conta da ovelhinha cor de rosa.
O tempo ia passando e a ovelha cor de rosa crescia junto aos bezerros. Fazia tudo o que os outros faziam, e gostava de morar ali. Mas, secretamente, tinha um sonho. De viver em uma família de ovelhas.
Um dia, uma família de ovelhas com o pêlo branquinho como a neve passou perto do pasto. E viram a ovelhinha cor de rosa junto às vacas, bois e bezerros. Estranharam.
  • Ovelhinha, você vive num pasto?
  • Sim. Fui deixada aqui ao nascer, e as vaquinhas me criam.
  • Mas isto está errado. Elas não são ovelhas!
  • Não são ovelhas, mas são a família que eu tenho.
  • Por que você não vem conosco? Assim você fará parte de uma família de ovelhas de verdade.
A ovelhinha cor de rosa mal cabia em si de tanta felicidade! Finalmente teria uma família de ovelhas! Outros seres que fazem méééé ao seu lado – ao invés do costumeiro múúúúú de todos os dias.
A família de ovelhas levou a ovelha cor de rosa para sua casa. A filha, uma ovelha que tinha a idade da ovelhinha cor de rosa, logo disse: 'você não pode usar meu pente, minha tiara e nem minhas presilhas de cabelo. Não quero um único fio de lã rosa estragando as minhas coisas'. A ovelhinha cor de rosa ficou chateada com a nova irmã, mas aceitou.
Com o tempo, porém, a ovelha cor de rosa viu que não usar o pente da irmã era o menor de seus males. Os pais colocaram as duas em escolas diferentes e pareciam ter vergonha da cor rosa de sua filha adotada. E a pobre ovelhinha cor de rosa começou a se sentir cada vez mais triste e sozinha.
Até que, numa tarde destas, a irmã ovelha começou a implicar com sua cor rosa. E elas brigaram feio. Os pais, então, tomaram uma decisão: 'não tem lugar para você nesta casa! Está na hora de voltar para seu pasto!'
As vaquinhas receberam a ovelhinha cor de rosa de braços abertos. Mas ela, coitadinha, sentia-se mais rejeitada que nunca. 'Será que nunca haverá alguém para apreciar o rosa de minha lã?', pensava.
Os bezerrnihos já estavam crescidos e, um a um, iam sendo vendidos ou trocados. Mimosa, uma bezerrinha gorducha muito amiga da ovelha cor de roda, foi vendida como vaca leiteira para uma pequena fazenda perto dali. E teve uma ideia:
  • Eles vem me buscar amanhã, num caminhãozinho. Eu vou fingir que empaquei, não entro no caminhão. Daí você corre e se esconde lá dentro. Vamos as duas juntas para a fazendinha!
  • Mas, e se não me quiserem por lá?
  • Vão querer, aposto! E além do mais, quem não arrisca não petisca! Vamos tentar, ué!
  • Está bem, está bem – concordou a ovelha cor de rosa.
No dia seguinte, dito e feito: a vaquinha fingiu que não ia entrar enquanto a ovelha cor de rosa se escondia dentro do caminhão. Foram as duas juntas para a fazendinha.
Quando chegaram e o dono da fazenda foi ver sua vaquinha, uma surpresa: viu, ali encolhidinha, uma ovelha cor de rosa. Gritou para a mulher e as filhas: 'venham ver isto!'
Quando viram a cor rosa da ovelha, as filhas do fazendeiro caíram de amores por ela. Nunca tinham visto nada tão bonito na vida. A mulher dele, encantada com a lã rosa, pediu: 'ovelhinha, posso cortar um tanto da sua lã?'
A ovelha cor de rosa, que nunca tinha sido tosquiada e vivia morrendo de calor, fez que sim com a cabeça. Com todo carinho, a mulher do fazendeiro tirou uma camada de lã dela e fez dois lindos casacos cor de rosa: um para cada uma de suas filhas.
A ovelhinha cor de rosa passou a ser o xodó da casa. Todos adoravam tê-la por ali. Deram-lhe uma enorme almofada e ela dormia ao lado da lareira. Durante o verão, a mulher do fazendeiro tirava toda sua lã e fazia lindos casacos. No inverno, a lã já tinha crescido mais forte, mais bonita, mais rosa, para aquecer a ovelhinha. Todos nas redondezas começaram a querer ter casacos daquela lã rosa tão diferente, tão macia, tão original.
E aquela irmã que tanto dizia que não queria lã rosa, mudou de ideia. Ao ver todos usando peças cor de rosa, quis também. Tingiu o pêlo uma, duas, doze vezes. Mas nunca conseguiu ter o pêlo tão rosinha e tão lindo quanto daquela que um dia fora sua irmã.
Já a ovelhinha cor de rosa vive muito bem na fazendinha. Passa as manhãs brincando com as vaquinhas, os potros, os patos e as galinhas. À tarde, as filhas do fazendeiro voltam da escola e fazem uma festa danada com ela! Ela vive cercada de amor, e aprendeu uma valiosa lição. Na vida, sempre vai ter alguém para dizer que somos diferentes, e que o diferente é errado. Mas errado é quem pensa assim! São as nossas diferenças que nos tornam seres únicos, especiais. E é maravilhoso poder ser do seu jeitinho, especial, diferente e único!